Friday, December 21, 2007

O fim da música?...

Apresentou-se no meio de outros 500 jovens, cada um com direito a 10 minutos para sonhar. Nesses 10 minutos tocou duas vezes na bola. No final da peladinha, o King veio ter com ele e pediu-lhe para aparecer no dia seguinte. Estas palavras, o King não as disse a mais nenhum outro dos 500 jovens que observou. Assim nasceu um dos maiores mitos de cumplicidade entre um jogador de um clube e os seus adeptos. Com 20 anos já mandava no meio-campo das águias. Aos 22 saiu para Itália onde se tornou Príncipe e Rei.
Na Selecção Nacional tornou-se objecto de admiração de todos, portugueses e estrangeiros, que sempre lhe reconheceram capacidade para inventar uma jogada, um passe, um dribble, e ficavam esperando com um brilho nos olhos e um sorriso nos lábios sempre que o esférico se colava, obediente, ao seu pé direito. Não teve a despedida merecida. Não só por causa do desfecho que teve o famigerado jogo contra os gregos mas também porque o Sr. Scolari não teve respeito por um dos maiores símbolos nacionais dos últimos 15 anos. A sua despedida da Selecção já havia sido anunciada. Todos esperavam que o seu canto do cisne fosse, de facto, perfeito, derramando cada gota de suor em prol de um objectivo comum (o EURO 2004) e pessoal (o final em beleza de uma carreira brilhante ao nível das selecções nacionais). O mister assim não entendeu. Deu-lhe 15 minutos para tentar operar um milagre. A verdade é que a turma das quinas rematou mais à baliza dos gregos nesse período do que nos outros 75 minutos. Mas a verdade é que não teve uma despedida condigna, muito por culpa do Sr. Scolari. Não me interpretem mal: não estou a dizer que Portugal tinha ganho o jogo se o nº10 jogasse de início. Sinceramente não gostei da conduta do seleccionador nacional para com um dos mais emblemáticos jogadores portugueses de sempre.
O que sempre me impressionou dentro de campo foi a sua atitude de liderança, sem receios de agarrar na bola e na equipa nos piores momentos, assumindo o papel de verdadeiro patrão. Aconteceu em Florença quando o rei era Batigol. Aconteceu em Milão quando o protagonista era Sheva. Um dos seus gestos mais característicos era gesticular, mandando os seus colegas de equipa avançar sempre que algum deles vinha a seu encontro para tentar uma jogada. Era como se dissesse "não preciso de ti para chegar com a bola lá à frente; preciso é de ti lá à frente para concluir a jogada". Gabriel Alves dizia que "ele é o colega de equipa que todos procuram num momento de aperto e ele dá a cara".
Aos 34 anos regressou à casa-mãe, como sempre tinha prometido aos adeptos e a si próprio. Sábio, ainda mais refinado tecnicamente e, acima de tudo, com a alegria e o orgulho de voltar a vestir a sua camisola 10 dos encarnados.
Os jogadores da sua geração já estão praticamente todos retirados. Como se isso não bastasse, pertence a uma casta que está em vias de extinção. Após a saída de cena de Zidane, ele ficou como o último dos mágicos. Talvez só Riquelme tenha condições para ser o herdeiro desta classe de jogadores, mas foi já criado numa concepção moderna de futebol que não se aplica aos seus antecessores.
Eu sempre aprendi, enquanto miúdo, a identificar o melhor jogador da equipa adversária pelo número da camisola: encontrado o nº10, encontrado o jogador mais tecnicista.
Quando, em Maio de 2008, o maestro decidir pendurar de vez as chuteiras, ele estará a insultar e a magoar todos os que gostam de ver bom futebol. No bom sentido, claro. Desfrutem das suas últimas jogadas pois estarão a desfrutar de momentos históricos.

Rui Costa.
O último Maestro.

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